Canto eu e a montanha dança, e outras histórias
O encontro fortuito do leitor com um grande livro
The unicorn purifies water
Canto eu e a montanha dança é um livro lindíssimo da escritora catalã Irene Solà (Editora Mundaréu). O título, tão curioso, já é um aviso que temos em mãos algo diferente.
Ele entrou para minha lista após uma publicação (que já não me recordo a autoria) no notes do Substack. E posso afirmar que foi um dos livros mais surpreendentes que li nos últimos tempos.
É impressionante a conexão que Irene Solà faz dos seus personagens-narradores com o ambiente, com a montanha. Através das histórias particulares de cada um (humanos e não-humanos), sentimos que todas estão conectadas, perpassam os tempos geológicos e históricos e fazem parte da mesma ancestralidade montanhosa. Tão logo terminei a leitura, tive vontade de recomeçar com medo de ter deixado escapar alguma beleza.
Na primeira página, desembarcamos nos Pirineus e iniciamos a jornada com a história de Domènec e sua morte trágica por um raio. A partir daí, cada capítulo conhecemos narradores diferentes: humanos e não-humanos que vivem pela montanha. Pessoas, corça, cachorro e até as nuvens. Sim, nuvens!!! Para os leitores, uma experiência mágica e transcendental; para a autora, meus parabéns por esse belíssimo trabalho, um banho de originalidade.
Parece que Irene Solà se adiantou e fez a literatura do Chthuluceno com Donna Haraway.
Não vou mentir que é preciso um pequeno esforço do leitor para entender quem está narrando cada capítulo, sobretudo no início, quando o formato da narrativa ainda não está claro. Quando desvendamos a leitura fica ainda mais bonita e surpreendente. É como uma peça de crochê que vai sendo costurada até se formar em uma peça completa, um cachecol - grande o suficiente para proteger toda a montanha do frio.
Fiz um amigo no ambiente mais improvável para conhecer pessoas interessantes: a academia. E meu novo amigo, Carlos (que já está no Substack), é professor de literatura, de uma inteligência refinadíssima, estudioso de muitos idiomas, foi professor de uma escola onde eu e minha filha estudamos.
Lembro de ler Crime e Castigo e me sentir órfã de interlocutores, até escrevi “Onde foram parar as conversas interessantes?”. Eu não conhecia Carlos, se o conhecesse não teria escrito esse texto. Mas agora o conheço e nos esbarramos toda semana na academia. Revezamos livros e não equipamentos.
Emprestei o livro da Solà ao Carlos e ele também gostou da leitura e me ensinou algo que não conhecia: a estética da recepção, que é a experiência do leitor através de seus rabiscos (?), interações (?) dobras (?)- o processo dialógico que tecemos quando esbarramos com os bons livros - esses sequestradores.
É quase indescritível a sensação de ter acertado em uma leitura. Tão logo nos damos conta da preciosidade que temos em mãos, percebemos que certos livros exigem um ambiente à altura – um pouco de requinte por parte do leitor. É preciso calma e meticulosidade. Lembro-me de ter levado Solà para ler na máquina de subir escadas e, rapidamente, percebi que seria um erro ler nessas circunstâncias. Guardei o exemplar na bolsa e criei um ritual respeitável para desfrutá-lo como merecia: sábados e domingos na minha espreguiçadeira.
Agora, meu exemplar se prepara para mais uma viagem. Vou emprestá-lo para uma outra amiga.
E assim os bons livros circulam.
A Verbena Cartaxo - escritora maravilhosa que temos por aqui - criou um Atlas das Mães no Substack. O intuito é criarmos uma rede de troca, suspiros, leituras, conversas e abraços. Espaço de comadres. Fica o convite para as mães conhecerem a proposta!
📚 O dia em que a Amazon me entregou um presente do acaso, Bruna Fonseca.
✨Cousas de garotas, Pinga com Limones.
🧵 Notas soltas de uma mente em lambança, Marcella Lima.
🏕 O amor na cidade da fúria, Junior Bueno.
💎 Flores, desertos, hábitos e cadernos proibidos, Rodrigo Padrini.
Beth e Neve curtindo minha espreguiçadeira
Parece um livro extraordinário mesmo, Raisa! Não sei se coloco na minha lista infinita de livros para ler, mas preciso dizer que fiquei curiosa, especialmente com o desenvolvimento dos personagens a cada capítulo. Deve ser incrível quando a narrativa se torna fluida e a gente consegue entrar na mente da autora, sabendo quem é que está narrando tal história.
E quanto a esbarrar com pessoas interessantes: o Substack pode ter vários defeitos, mas vou te dizer que adoro essa comunidade aqui que vem se formando mais e mais a cada dia!
Louca para ler esse livro. Já estava na minha lista e, com esse relato, pulou mais umas vagas para frente, haha!